Dia das crianças: resgate a sua criança interior

Qual foi a última vez que você pisou na grama, correu na chuva, pulou em cima da cama ou se permitiu fazer coisas que remetem à sua infância?

“A gente olha o mundo só uma vez, durante a infância. O resto é lembrança”, escreveu em letras poéticas a norte americana Louise Glück, vencedora do Nobel da Literatura em 2020. Essa frase me fez refletir sobre o quanto nos tornamos sérios, ás vezes chatos e sem graça depois de adultos. Pensando nisso, resolvi abordar este tema no dia das crianças.

Muitas vezes as pessoas associam seus momentos de felicidade ao passado: “quando eu era feliz e não sabia”, “queria voltar a ser criança para ser feliz de novo”. As responsabilidades do dia a dia, o stress e os problemas da vida adulta muitas vezes nos fazem deixar de lado e até esquecer de coisas que nos deixam alegres, que nos proporcionam prazer, que nos fazem rir à toa, e que frequentemente estão associadas à nossa infância.

As crianças têm uma grande virtude que abandonam à medida que vão se tornando adultos como a curiosidade, a capacidade de se deslumbrar com cada descoberta e de observar cada acontecimento como se fosse único, além de enxergar beleza nas pequenas coisas.

“O homem seria metafisicamente grande se a criança fosse seu mestre”, já dizia o filósofo Sören Kierkegaard.

Hoje, no Dia das Crianças queremos propor a você conectar-se com essa criança interior e resgatar a  meninice, a brincadeira, o jeito moleque. Crescer é uma tarefa difícil, o peso da vida adulta chega de forma muito dura para algumas pessoas, mas ainda assim não podemos deixar que a nossa criança interior adormeça e que nos tornemos adultos insatisfeitos ou amargurados. É preciso exercitar a espontaneidade, o desapego, o olhar curioso, sem medo de experimentar algo novo. Para isso, você deve se perguntar: “o que eu gostava de fazer?”, “em que eu era bom?’? Esses exercícios podem te ajudar a se conectar com a infância e com essa criança. E então, a proposta é começar hoje mesmo, agora!

Eu me lembro bem de algo que gostava de fazer quando criança e vou te contar brevemente. Na casa onde eu morava – dos meus pais – tinha uma amoreira, a árvore que dava como fruto a amora. Ela era grande, robusta e bonita, lá era o nosso quintal. Eu e minhas duas irmãs, a Cris e a Chinha, gostávamos de subir no tronco da amoreira e catar as amoras que estavam maduras, as roxinhas. Cada uma subia carregando uma bacia. Eu levava a banheirinha  alaranjada da minha boneca debaixo do braço e ia escalando a amoreira. Descíamos com as bacias carregadas e a aventura em seguida era comê-las no pé e ver quem ficava mais roxa, e isso incluía a boca, o rosto e as mãos. Era divertida e gostosa essa atividade! E você, qual a sua lembrança gostosa e divertida?

Já ouviu uma frase do tipo: “quando você era criança você era tão espontânea” ou “tão criativa”? Isso tem muita relação com a sua essência, com o seu eu natural. Muitas vezes, ao escutar na infância e adolescência que você deveria “se comportar melhor e responder apenas quando lhe perguntassem algo” ou “procurar uma profissão de verdade, porque ser artista não daria dinheiro”, você acabava reprimindo os seus desejos, sentimentos que te faziam bem e abandonou coisas que você gostava muito de fazer. Simplesmente porque cresceu.

Ao fazer exercícios para resgatar esses aspectos da sua infância, você pode redescobrir um  dom ou talento adormecido e usá-lo a seu favor. Nada é trivial e infantil, por assim dizer. No meu caso, durante a pandemia eu redescobri uma habilidade da minha infância e juventude – a de fazer paródias. Sim, paródias! Mas calma, não é algo sobre deboche ou coisa do tipo! A melodia das canções e uma excelente técnica de memorização. E, modéstia à parte (risos), eu era boa. Na escola, eu comecei a fazer as paródias nas aulas de ciências, pois era o trabalho proposto pela professora e tinha fila de colegas querendo que eu fizesse para eles. E até hoje não esqueci as letras! “E se o átomo possui núcleo e eletrosfera, nesta ficam os elétrons, prótons e nêutrons …” – só uma palhinha no ritmo da música Paz na cama, de Leandro e Leonardo.

Foi uma memória boa e divertida que emergiu das minhas lembranças nessa quarentena e então eu resolvi dar vazão a ela.  Sendo assim, nas últimas semanas desenvolvi criar paródias relacionadas à minha atividade profissional. Uma amiga cantora está gravando as canções, que são clássicos da nossa MPB com uma pitada terapêutica. Também adorava representar… esse é o máximo que posso contar para vocês neste momento, é uma surpresa!

Relatei aqui uma história e essa minha redescoberta para mostrar que o mesmo pode ocorrer com vocês. É preciso estar aberto a isso e buscar lá no fundo essa conexão com a sua criança interior. Para te ajudar nessa aventura, aqui vão algumas dicas:

– Experimente fazer coisas pela primeira vez

Tente fazer coisas diferentes, coloque-se em situações desconhecidas, explore possibilidades variadas, dê risadas.  A verdade é que esses primeiros momentos da vida têm toda uma magia envolvida e podem nos fazer muito bem.

– Escolha uma atividade criativa

É importante separar um tempo, por menor que seja, para alguma atividade que estimule sua criatividade e movimente a mente e o corpo. Para que você tenha liberdade de desfrutar das atividades, por puro prazer. Aqui vale pular corda (aquela grande, com duas pessoas girando!), amarelinha, brincar com algum jogo de tabuleiro, pegador, queimada…e poraí vai. O objetivo é você usar a criatividade e se divertir.

– Passe um tempo com crianças

Brincar é algo prazeroso. Claro que não vamos conseguir fazer da mesma forma que fazíamos quando crianças, mas estar na companhia delas pode te estimular a fazer coisas que saem do seu cotidiano como: andar descalço, pintar, desenhar, jogar,  ler, contar histórias e resgatar coisas que te faziam feliz na infância. Além disso, a prática te ajudar a desacelerar, curtir o momento e se fazer presente. Você pode fazer mágicas, contar histórias e rir junto com as crianças, fazer e receber cócegas. Que tal experimentar?

– Filmes e Livros

Poetas brasileiros como Manoel de Barros e Mário Quintana são exemplos clássicos da nossa literatura de pessoas que nunca esqueceram o olhar infantil para as coisas da vida. O primeiro traz o olhar do campo para as coisas, já o segundo explora as possibilidades do encantamento da vida como se fosse uma criança a traduzir. Um bom livro também, que nos mata de candura é “O Livro das Perguntas” do poeta Chileno Pablo Neruda. Cada verso é feito na forma de um questionamento e as interrogações sobre as questões cotidianas, sob a perspectiva de uma criança.

Um bom livro de leitura também é Festa no Covil do mexicano radicado no Brasil Juan Pablo Villalobos. A obra, que em um final de semana você facilmente devora, narra de forma ingênua e perspicaz o dia a dia do Tochtli, um garotinho esperto e simpático que mora com o pai narcotraficante em uma mansão no meio do deserto. A história não aborda a violência, mas sim como fatos da vida adulta são narrados por uma criança.

Filmes! O fantástico volta e meia é utilizado em filmes para contar histórias leves e divertidas. Exemplo disso são os pré-adolescentes ou crianças que num passe de mágica se tornam adultas:  “De repente 30” (2004) com a atriz Jennifer Garne; “Quero Ser Grande” com Tom Hanks (1988). E há boas animações que nos fazem pensar sobre a vida adulta como Toy Story 3; Up – Uma Aventura.

– Ria alto

A prática de rir sem motivo, rir à toa, alto e profundo também é uma boa maneira de se conectar com a infância. Então, vamos fazer simulações, movimentos corporais dando risadas, cair numa montanha de almofadas aos risos, conversar em Gibberish (linguagem de sons sem significado, que ninguém entende as palavras).

Além disso, o Yoga do Riso é uma ferramenta que auxilia no processo de cura da criança interior ferida.

Então, nesse Dia da Criança, liberte sua criança interior e se permita fazer coisas pela primeira vez novamente. E tenham um feliz e divertido dia das crianças!

2 comentários

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  • Clélia, obrigada pelo comentário e que bom que serviu para uma boa reflexão. Sim, quanto mais o tempo passa, mais nos esquecemos das coisas. Isso por um lado é bom e serve até como uma estratégia de defesa do nosso cérebro e, por outro lado, é ruim porque não nos recordamos dos bons momentos.
    Que tal então se destravar hoje, se libertar dessas amarras cheias de “não pode” e se permitir ser humana e criança? Isso, dependure essas vestimentas sociais do seu passado e dance, cante, resgate a sua alma criativa. Abraços

  • Parabéns pela reflexão! O resgate, para quem passou dos 70, não é fácil… Na nossa época foram muitas “travas”, muitos “não pode”… Enfim, eu tento, mas ficaram tatuados na alma alguns dos entraves pseudosociais… Vou caminhando e tento despir as “vestimentas sociais do passado” . Grata por esse texto.

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